Sábado. Todas exaustas da semana intensa de chuva e trabalho, este que, para nós mulheres, se estende para muito além do horário comercial. Até que a temperatura do dia estava amena, e o calor insuportável de todos os nossos encontros não era mais um desafio a ser superado. Neste momento o texto a ser estudado era sobre o Brincar na Educação Infantil, artigo da querida Ângela Borba, estudiosa dos assuntos da infância e que atua no cotidiano escolar(coisa rara entre os “grandes” nomes da educação, cuja maioria nunca entrou numa sala de aula). Mas enfim, o assunto não é bem esse. Voltemos. Após discussões intensas sobre a importância do brincar, propomos uma dinâmica na qual cada uma de nós falaríamos sobre alguma memória da infância, relacionada a algum brinquedo que escolhêssemos (havia brinquedos expostos na sala).
Várias memórias foram verbalizadas: umas felizes, outras tristes, e todas me reforçando a certeza do quanto as marcas da infância são carregadas pela vida afora, pro bem e pro mal. Mas uma fala, em especial, mexeu comigo, e está me perturbando até agora. A moça jovem, de sorriso largo, disse que havia nascido aos 10 anos de idade, pois antes disso vivia doente, numa infinidade de alergias que ninguém sabia o porquê. Não podia brincar, só conseguiam parar no estômago água com fubá, não tinha forças pra ir à escola, não podia suportar o pó do giz, não convivia com outras crianças, enfim, e nesse monte de “não poder nada” a única coisa a se fazer era ficar admirando a paisagem, que por sinal era bem bonita, no interior de minas gerais.
A paisagem e as intermináveis possibilidades de agir sobre ela a deixava ainda mais triste. Não se sentia viva na vida, apenas observava. Até que aos 10 anos de idade, já no Rio de Janeiro, as doenças começaram a desaparecer, e a menina começou a nascer. Só então pôde experimentar as árvores, as pessoas, a escola e o mundo. A menina sentiu-se, pela primeira vez na vida, viva, pois agora ela podia escolher brincar, podia aprender a ler e podia sair por aí e viver, embora as mazelas da contemporaneidade nem sempre nos permita. O dia de seu nascimento estava bem definido em sua cabeça: 10 anos após o parto oficial. Antes ela ainda estava maturando no ventre da mãe. Imagine só, 10 anos de gestação!
Eu forço a memória, mas não consigo lembrar-me do dia que nasci. Será que foi mesmo no parto de minha mãe? (pelo que ela diz a experiência não foi das mais agradáveis) Será que quando aprendi a ler? Será que foi quando me percebi amando pela primeira vez? Quando me casei? Ou quando descobri o mar?... Não sei... Às vezes a gente só percebe que nasceu quando morrem algumas coisas... Mas que estou vida, ah... isso eu sei que estou! (e esse é assunto pra um outro post).
É preciso certa dose sensibilidade para se perceber na vida e de muita coragem para viver. Agora, para perceber nosso próprio nascimento, a sensibilidade dever ser ainda maior... Quem sabe um dia eu me lembre? Ou ainda, quem sabe eu descubra que ainda nem nasci? Será?
E você? Lembra-te do dia do teu nascimento?

Isa, quantas palavras bonitas!!!
ResponderExcluirFiquei muito feliz quando li seu recadinho e soube dessa entrada oficial no universo dos blogs. Acho que pensamentos como este, que fazem brotar tantos outros, precisam sim de registro. Que bom faz em escrevê-los!
Também não sei selecionar qual o evento que marca meu nascimento, mas tenho tantas lembranças boas da minha infância que esse assunto me faz viajar no tempo! sorrisos!
Um beijo, vou voltar muitas vezes aqui!
Q visita gostosa, Lu! Seja sempre bem vinda, e mais sorrisos pra ti!
ResponderExcluirBjs.:)
Isa,
ResponderExcluirMuito interessante! Perguntinha difícil...
Vou pensar sobre o assunto, mas o que sei é que nunca me senti da mesma forma que a sua colega. Isso, realmente, nos faz refletir sobre o quanto devemos agradecer e aproveitar cada minuto de nossas vidas da melhor maneira possível.
Abraços!
Acho que já nasci e renasci algumas vezes, frente às conquistas, às alegrias ou às dificuldades da vida. Mas hoje tenho certeza de que já há um novo renascer programado pra mim... a chegada do João Bernardo, a quem eu amo mais e mais a cada dia.
ResponderExcluirÉ verdade, Max. E às vezes nos esquecemos disso.
ResponderExcluirObrigada pela interação.
Bjs.
Ah, minha amiga... Eu tbm aguardo ansiosa a chegada deste (re)nascimento! E eu tbm já amo o Bernardinho, esse sonho transformado em realidade! Aguardo contigo essa novo renascer!
Bjs.
Liiiindo! ;) vc tem o dom de usar as palavras pra tocar as pessoas.. beijos!
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