sábado, 31 de dezembro de 2011

Caro 2011

Você bem que chegou fazendo festa em mim, mas assim que acordei vi que não era bem assim: o Rio chorava, e eu chorei também. Mas ainda assim eu podia sentir que tudo ia melhorar, que boas notícias viriam. Algumas até vieram mesmo, e eu pude comemorar. No entanto, muitas outras notícias e acontecimentos foram tão terríveis que até hoje meus olhos não secaram. Mas tudo bem, pois é certo que, de alguma forma, a gente cresce. Cresce que nem criança em fase de crescimento: meio que sem querer; o corpo dói e demora a se ajustar à nova forma, mas no fim a gente vê que é necessário. 


Ainda não há nada ajustado aqui. Ainda há muito doendo, profundamente. Mas há amigos, há família e há um desejo enorme de qualquer coisa muito boa. Você está indo embora e eu colocarei um roupa bonita pra dizer adeus. Me esforçarei para sorrir para ti e tentarei não levar mágoas. Passei esses 365 dias contigo tentando acreditar que tudo era pro meu crescimento. E se crescer dói, acho que é isso mesmo que tem sido todos esses dias. 


Então, apesar de tudo, obrigada. E lembre-se de avisar pro seu amiguinho que vai chegar, que venha com mais calma, tá bom?


Bjs e NÃO me liga!

domingo, 11 de dezembro de 2011

Quase carta (ao Zé II)

Oi Zé. Desculpe-me por não retornar o telefonema. Desculpe-me por escrever-te só agora, depois de tantos dias, meses, nem sei... Desculpe-me por não te ligar. Não foi por falta de tempo não, Zé. Não sei porquê, mas às vezes eu simplesmente não ligo, fico deixando pra depois, pra depois... e tudo vai passando. Engraçado que tudo vai passando, mas algumas coisas permanecem pra sempre. Coisas boas e coisas ruins. Eu tenho tentado muito fazer com que as coisas ruins passem rápido, mas nem sempre dá. As coisas boas, eu tento agarrá-las o mais forte que consigo, mas às vezes minhas mãos são pequenas demais e não conseguem segurá-las por muito tempo, então elas acabam escorrendo por entre os dedos como areia de praia. Mais a vida é isso mesmo, a gente segura, empurra, faz como se tudo dependesse exclusivamente das nossas mãos, mas sabemos que não é bem assim.


O Natal está chegando, Zé. Fico pensando que a sua casa deve estar toda decorada de luzes. Aqui em casa, só as luzes das lâmpadas do teto mesmo. Perdi a paciência de enfeitar a vida com pisca piscas, como se isso mudasse realmente alguma coisa. Ando preferindo deixar tudo apagadinho pra ver se acende alguma coisa aqui dentro. Talvez eu consiga agarrar uma luzinha qualquer e segurá-la com os pensamentos. Talvez eu consiga fazer como eu fazia com as velas de meus aniversários de criança que, quando se apagavam, eu as isolava com minhas pequenas mãos até que se acendessem novamente. As outras crianças faziam questão de apagá-las de novo, mas eu conseguia acendê-las outras vezes mais. Por fim, as velas se apagavam de vez, mas mantinha em meu coração alguma luz, alguma quentura. É isso que eu quero neste natal, Zé. Uma luz diferente de pisca piscas, uma luz que nem precisa ser tão colorida, mas que deixe meu coração quentinho, acreditando. Natal luz dentro de mim.

...

Desculpa, Zé. Acho que não liguei porque ando mesmo sem vontade de falar. E agora que comecei a escrever, acho melhor parar. Não quero te escrever uma carta triste. Eu tinha outras coisas para te dizer, coisas mais bonitas para este fim de ano, mas simplesmente as esqueci quando peguei a caneta... O tempo passa tão rápido e tão ríspido e eu me esqueci do tanto que eu tinha guardado pra você.  Ando muito cansada, Zé...


Então, bom Natal. Em 2012 eu apareço com boas notícias.


Abraço afetuoso,


Isabele.





segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Conta pra mim (Ana Jácomo)

Conta pra mim de onde a gente se conhece. De onde vem a sensação de que sempre esteve aqui, quando eu sei que não estava. Conta por que nada do que diz sobre você me parece novidade, como se eu estivesse lá, nos lugares que relembra, quando eu sei que não estive. Conta onde nasce essa familiaridade toda com os seus olhos. Onde nasce a facilidade para ouvir a música de cada um dos seus sorrisos. Onde nasce essa compreensão das coisas que revela quando cala. Conta de onde vem a intuição da sua existência tanto tempo antes de nos encontrarmos.

Conta pra mim de onde a gente se conhece. De onde vem o sentimento de que a sua história, absolutamente nova, é como um livro que releio aos poucos e, ao longo das páginas, apenas recordo trechos que esqueci. Conta de onde vem a sensação de que nos conhecemos muito mais do que imaginamos. De que ouvimos muito além do que dizemos. De que as palavras, às vezes, são até desnecessárias. Conta de onde vem essa vontade que parece tão antiga de que os pássaros cantem perto da sua janela quando cada manhã acorda. De onde vem essa prece que repito a cada noite, como se a fizesse desde sempre, para que todo dia seu possa dormir em paz.

Conta pra mim de onde a gente se conhece. De onde vem essa repentina admiração tão perene. De onde vem o sentimento de que nossas almas dialogavam muito antes dos nossos olhos se tocarem. Conta por que tudo o que é precioso no seu mundo me parece que já era também no meu. De onde vem esse bem-querer assim tão fácil, assim tão fluido, assim tão puro. Conta de onde vem essa certeza de que, de alguma maneira, a minha vida e a sua seguirão próximas, como eu sinto que nunca deixaram de estar.

Conta pra mim por que, por mais que a gente viva, o amor nos surpreende tanto toda vez que vem à tona.

***

Muito mais em http://anajacomo.blogspot.com/

sábado, 19 de novembro de 2011

Anjos

Eu não tenho o direito de pensar que está tudo perdido. Não, não está. E nesses dias tão difíceis, me mostram diariamente que é preciso acreditar na vida, e sem saber, me dizem que ainda vale a pena confiar em alguém, ter amigos com quem sorrir e com quem chorar. E o dizem sem dizer uma palavra sequer, pois são nos mínimos gestos que o cuidado se faz presente. Amigos são assim, não precisam de atos mirabolantes para se mostrar, são como anjos que chegam na calada da noite para fazer um cafuné, para mostrar que nunca estamos sós. 


domingo, 13 de novembro de 2011

A escola

Escola é...
O lugar onde se faz amigos
Não se trata só de prédios, salas, quadros,
Programas, horários, conceitos...
Escola é, sobretudo, gente,
Gente que trabalha, que estuda,
Que se alegra, se conhece, se estima.
O diretor é gente,
O coordenador é gente, o professor é gente,
O aluno é gente,
Cada funcionário é gente.
E a escola será cada vez melhor
Na medida em que cada um
Se comporte como colega, amigo, irmão.
Nada de “ilha cercada por todos os lados”.
Nada de conviver com as pessoas e depois descobrir
Que não tem amizade a ninguém
Nada de ser como o tijolo que forma a parede,
Indiferente, frio, só.
Importante na escola não é só estudar, não é só trabalhar,
É também criar laços de amizade,
É criar ambiente de camaradagem,
É conviver, é se “amarrar nela”!
Ora, é lógico...
Nunca escola assim vai ser fácil
Estudar, trabalhar, crescer,
Fazer amigos, educar-se,
Ser feliz.



(Paulo Freire)



Em homenagem à equipe da Escola Municipal Maria Eliondas dos Santos
(falta Fabiana)

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

O que há

Foi no mínimo estranho andar pela rua e ver o passado na calçada. Identifiquei-o no mesmo instante que meus olhos apontaram sua direção. Sorri um tanto desconcertada e por alguns segundos não soube o que fazer: passar direto como quem não quer nada, ou apertar-lhe as mãos e convidá-lo para uma prosa? Acabei decidindo que nada de “ou isso ou aquilo”; apenas o vi passar, com a graciosidade da menina que ainda não se foi por completo; com uma sutil tristeza que ainda persiste e com aquele andar descompassado que ainda não se ajeitou ao corpo. Feliz, sim, embora nunca tivesse aparentado alguma alegria esfuziante. Apenas reparei. E até que achei bonito todo aquele porvir... 
O que passou parece-nos sempre mais bonito. Mas quando voltei aos meus agoras e olhei-me no espelho, tudo se repetiu. O passado é o que há. Pouco da essência se perdeu. Era a mesma menina da calçada, o mesmo olhar triste e o mesmo caminhar de pernas trocadas. Ainda feliz, sim. E já até aprendeu a se mostrar assim.



segunda-feira, 7 de novembro de 2011

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Lula, o câncer, o SUS e o Sírio (Elio Gaspari)

As pessoas que estão reclamando porque Lula não foi tratar seu câncer no SUS dividem-se em dois grupos: um foi atrás da piada fácil, e ruim; o outro, movido a ódio, quer que ele se ferre. Na rede pública de saúde, em 1971, Lula perdeu a primeira mulher e um filho. Em 1998, o metalúrgico tornou-se candidato à Presidência da República e pegou pesado: "Eu não sei se o Fernando Henrique ou algum governador confiaria na saúde pública para se tratar". Nessa época acusava o governo de desossar o SUS, estimulando a migração para os planos privados. Quando Lula chegou ao Planalto, havia 31,2 milhões de brasileiros no mercado de planos particulares. Ao deixá-lo, essa clientela era de 45,6 milhões, e ele não tocava mais no assunto.

Em 2010, Lula inaugurou uma Unidade de Pronto Atendimento do SUS no Recife dizendo que "ela está tão bem localizada, tão bem estruturada, que dá até vontade de ficar doente para ser atendido". Horas depois, teve uma crise de hipertensão e internou-se num hospital privado.

Lula percorreu todo o arco da malversação do debate da saúde pública. Foi de vítima a denunciante, passou da denúncia à marquetagem oficialista e acabou aninhado no Sírio-Libanês, um dos melhores e mais caros hospitais do país. Melhor para ele. (No andar do SUS, uma pessoa que teve dor de ouvido e sentiu algo esquisito na garganta leva uns 30 dias para ser examinada corretamente, outros 76, na média, para começar um tratamento quimioterápico, 113 dias se precisar de radioterapia. No andar de Lula, é possível chegar-se ao diagnóstico numa sexta e à químio, na segunda. A conta fica em algo como R$ 50 mil.)

Lula, Dilma Rousseff e José Alencar trataram seus tumores no Sírio. Lá, Dilma recebeu uma droga que não era oferecida à patuleia do SUS. Deve-se a ela a inclusão do rituximab na lista de medicamentos da saúde pública.

Os companheiros descobriram as virtudes da medicina privada, mas, em nove anos de poder, pouco fizeram pelos pacientes da rede pública. Melhoraram o acesso aos diagnósticos, mas os tratamentos continuam arruinados. Fora isso, alteraram o nome do Instituto Nacional do Câncer, acrescentando-lhe uma homenagem a José Alencar, que lá nunca pôs os pés. Depois de oito anos: 1 em cada 5 pacientes de câncer dos planos de saúde era mandado para a rede pública. Já o tucanato, tendo criado em São Paulo um centro de excelência, o Instituto do Câncer Octavio Frias de Oliveira, por pouco não entregou 25% dos seus leitos à privataria. (A iniciativa, do governador Geraldo Alckmin, foi derrubada pelo Judiciário paulista.)

A luta de José Alencar contra "o insidioso mal" serviu para retirar o estigma da doença. Se o câncer de Lula servir para responsabilizar burocratas que compram mamógrafos e não os desencaixotam (as comissões vêm por fora) e médicos que não comparecem ao local de trabalho, as filas do SUS poderão diminuir. Poderá servir também para acabar com a política de duplas portas, pelas quais os clientes de planos privados têm atendimento expedito nos hospitais públicos.

Lula soube cuidar de si. Delirou ao tratar da saúde dos outros quando, em 2006, disse que "o Brasil não está longe de atingir a perfeição no tratamento de saúde". Está precisamente a 33 quilômetros, a distância entre seu apartamento de São Bernardo e o Sírio.


(Artigo Publicado por Elio Gaspari na Folha de São Paulo de 02/11/11)


Minha mãe, assim como outros tantos brasileiros, está em tratamento contra o câncer pelo SUS. Após o diagnóstico, que demorou mais de um mês (na rede privada), tivemos que esperar mais de 2 meses para o início efetivo do tratamento (quimioterapia) em hospital conveniado ao SUS. Quase quatro meses de espera estão fazendo toda a diferença no tratamento, pois foi o tempo necessário para o tumor dobrar de tamanho.

"Só há que sublinhar, há que ressaltar, há que insistir aos brasileiros, meus irmãos: corações, fígados, sangue e rins – são todos muito iguais. Não há diferenças relevantes. O cargo ocupado não pode, não poderia, não deveria fazer a diferença entre a vida e a morte." (Fernando Vieira)


segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Da noite

Ah, noite. Fica comigo essa noite! Pois tu não me és solidão, mas companhia das boas! Gosto de ti e não é gratuito meu gostar. Foi na tua presença que aprendi a me fazer companhia, e isso me é caríssimo. Parei de me dispensar por qualquer distração. Na tua companhia, aprendi ouvir meus pensamentos e dissipar elucubrações. Pude ver o quanto é bela a tua partida ao amanhecer. Descobri que poesia é mais gostosa que brigadeiro. Contigo, noite, as músicas são mais românticas. Os sons da rua, mais singelos. Os gatos são pardos. Meu coração, mais aberto. Gosto de quando estamos sós. E tu me dizes coisas que jamais me seria dito num dia ensolarado. És sincera, noite. E gosto disso, por mais que me doa às vezes. É em tua escuridão, em dias nublados como o de hoje, que melhor me enxergo. Com céu estrelado damos gargalhadas. E é tão bom sorrir contigo! E essa chuva que canta em meus ouvidos? Ah, canta aqui pra eu dormir, vai...

Amanhecer no centro de Nova Iguaçu

domingo, 30 de outubro de 2011

Linger (The Cranberries)

Sabe quando a música não sai da sua cabeça?

Ando assim com esta...

sábado, 29 de outubro de 2011

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Eles

Ele é sono; ela, insônia.
Ele é silêncio; ela é palavra.
Ele é Fla; ela é Flu.
Ele é riso contido; ela, gargalhada.
Ele é solidão; ela, multidão.
Ele se balança; ela samba.
Ele quer ganhar um milhão; ela quer gastar um milhão.
Ele gosta de tecnologias; ela gosta de livros de papel.
Ele é rock; ela é bossa.
Ele, lapiseira; ela, lápis.
Ele, vinho; ela, caipirinha.
Ele é dia; ela é noite.
Ele quer comédia; ela, drama.
Ele chora pra dentro; ela chora pra fora.
Ele é carente; ela finge que não.
Ele espera; ela tem pressa.
Ele é serra; ela, mar.
Ele é som ambiente; ela é no último volume.
Ele, listrado; ela, estampado...
...

Ele quer aprender a dançar, ela quer entender o tablet.
Eles acabam torcendo pro time do outro.
Ela precisa dormir de vez em quando, e ele precisa acordar.
A vida dele precisa de mais barulho, e a dela de mais silêncio.
Eles vão pra onde tem serra e mar ao mesmo tempo.
Ela lê para ele. Ele a ensina jogar vídeo-game.
Eles misturam listras com estampas no melhor estilo retrô.
Eles riem...
...

Mas às vezes a dança sai do compasso.
Às vezes eles não entendem.
Às vezes ela não acha graça no filme, e ele não suporta o drama.
Às vezes ela quer mergulhar e ele que subir.
Às vezes ela não baixa o volume, e ele não quer dançar.
Às vezes eles choram juntos.
...

Dois mundos.
Eles conseguem olhar para a mesma direção...
...

Ah, eles se amam!


E basta!


domingo, 9 de outubro de 2011

Sem saber

Amo como quem não tem nada mais para fazer. Amo de me atrapalhar com as coisas da vida. Como se nada mais existisse. Amo sem proporção ou consequência, sem medida. Amo tanto que até me dói. Como se tudo me faltasse para tanto amar. Amo de nos machucar. Amo até sair sangue. Até perder o ar. Até perder a mim mesma. Até perder você.


...


Ainda não aprendi a amar.



Malemolência - Céu

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Rastros



Fui caminhando no rastro deixado pelos teus pés
Ensimesmada no caminho por onde andaste
Encaixando meu próprio caminho nas tuas marcas
Feito criança
Saltei até cada passo teu
Passos forte
Pés firmes

Marcas de suor e lágrimas ressecados de sol
Contei cada gota deixada pra trás
Enfeitei com flores secas teus caminhos
Rezando pra que não percam as cores que ainda restam
Uma lágrima minha escorreu
Deixando-se ser levada
Pelo vento ressequido de inverno findando

Não sabia se era beleza o que se passava
De todo o modo
Chegou setembro
E novo colorido se prepara pra nos enfeitar

Nossos caminhos passados
Nossos rastros
Continuarão aqui
Como se fosse saudade querendo ser lembrada.

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Bem ou malmequer?




Diz o senso-comum que amar é não esperar nada em troca. Pois eu duvido. Mais me parece que o amor é uma via de duas mãos. Aquele que ama deseja também receber amor. Nesse sentimento, todos querem ser correspondidos. Para a maior parte das pessoas, amar sozinho é insuficiente, inodoro, insosso e insípido.

Amar é desejar ser amado. O amor humano é algo bastante exigente e inseguro. O amante dificilmente tem a certeza de ser correspondido. Vive pedindo provas disso. Acontece que o amor é coisa que se experimenta, não se prova. Isto é, nenhuma prova de amor é suficiente. E isso não é privilégio do amor romântico, é assim com todas as relações.

A mãe quer que o filho, que é introvertido e seco, lhe diga o quanto a ama. O pai quer que aquele filho que tem dificuldade na escola, tire notas altas. O namorado quer que a namorada, recatada, faça estripulias no sexo. A namorada, que tem um par que é aversivo ao casamento, quer justamente isso dele: se casar. É, o amor pede justamente aquilo que o outro não pode dar.

Que graça tem ganhar beijos de um beijoqueiro? Receber flores do dono da floricultura? Ganhar poemas do poeta? Isso tudo é café pequeno. O amor é megalomaníaco e quer o impossível.

Porque o que o ser humano deseja é se sentir especial. Não se contenta em ser amado, quer mais, quer que o outro lhe mostre isso. Quer que o amado mova montanhas, transforme água em vinho.

Mas isso tudo é puro jogo que o sentimento e a razão fazem. Porque racionalmente, esse desejo de querer provas de amor não faz o menor sentido. Principalmente porque, se acontece de uma pessoa conseguir, efetivamente, provar o seu amor à outra pessoa, o jogo acaba. E o amado se queixa de se sentir “sufocado”. Diz que o outro “perdeu a graça”.

O amor está sempre escondendo algo, tem sempre algo de oculto. Porque aquele que ama faz as palavras serem insuficiente. Não sabe dizer ou explicar o amor ou a escolha pelo amante. O amor é uma paixão de desconhecimento. Por um lado não se sabe por que se ama, por outro lado não se sabe se é também amado.

Amar é pisar em ovos. Porque toda a graça está na dúvida. Ele(a) me ama, ele(a) não me ama, ele(a) me ama, ele não me ama. Bem-me-quer, mal-me-quer.


SUY, Ana. In: Significantes.


sábado, 20 de agosto de 2011

A tristeza permitida



Se eu disser pra você que hoje acordei triste, que foi difícil sair da cama, mesmo sabendo que o sol estava se exibindo lá fora e o céu convidava para a farra de viver, mesmo sabendo que havia muitas providências a tomar, acordei triste e tive preguiça de cumprir os rituais que normalmente faço sem nem prestar atenção no que estou sentindo, como tomar banho colocar uma roupa, ir pro computador, sair para compras e reuniões – se eu disse que foi assim, o que você me diz? Se eu lhe disser que hoje não foi um dia como os outros, que não encontrei energia nem para sentir culpa pela minha letargia, que hoje levantei devagar e tarde e que não tive vontade de nada, você vai reagir como? 

Você vai dizer “te anima” e me recomendar um antidepressivo ou vai dizer que tem gente vivendo coisas muito mais graves do eu (mesmo desconhecendo a razão da minha tristeza), vai dizer para eu colocar uma roupa leve, ouvir uma música revigorante e voltar a ser aquela pessoa que sempre fui, velha de guerra.

Você vai fazer isso porque gosta de mim, mas também porque é mais um que não tolera a tristeza: nem a minha, nem a sua, nem a de ninguém. Tristeza é considerada uma anomalia do humor, uma doença contagiosa, que é melhor eliminar desde o primeiro sintoma. Não sorriu hoje? Medicamento. Sentiu vontade de chorar à toa? Gravíssimo, telefone já para o seu psiquiatra.

A verdade é que eu não acordei triste hoje, nem mesmo com uma suave melancolia, está tudo normal. Mas quando fico triste é comum, é um sentimento tão legítimo quanto a alergia, é um registro da nossa sensibilidade, que ora gargalha em grupo, ora busca o silêncio e a solidão. Estar triste não é estar deprimido.

Depressão é coisa muito mais séria, contínua e complexa. Estar triste é estar atento a si próprio, é estar desapontado com alguém, com vários ou com si mesmo, é estar um pouco cansado de certas repetições, é descobrir-se frágil num dia qualquer, sem uma razão aparente – as razões têm essa mania de serem discretas.

“Eu não sei o que meu corpo abriga/ nestas noites quentes de verão/ e não importa que mil raios partam/ qualquer sentido vago de razão/ eu ando tão down ...”. Lembra da música? Cazuza ainda dizia lá no meio dos versos, que pega mal sofrer. Pois é, pega. Melhor sair pra balada, melhor forçar um sorriso, melhor dizer que está tudo bem, melhor desamarrar a cara. "Não quero te ver triste assim”, sussurrava Roberto Carlos em meio a outra música. Todos cantam a tristeza, mas poucos a enfrentam de fato. Os esforços não são para compreende-la, e sim para disfarçá-la, sufocá-la, ela que, humilde, só quer usufruir do seu direito de existir, de assegurar o seu espaço nesta sociedade que exalta apenas o oba-oba e a verborragia, e que desconfia de quem está calado demais. Claro que é melhor ser alegre que ser triste (agora é Vinicius), mas melhor mesmo é ninguém privar você de sentir o que for. Em tempo: na maioria das vezes, é a gente mesmo que não se permite estar alguns degraus abaixo da euforia. 

Tem dias que não estamos pra samba, pra rock, pra hip-hop, e nem por isso devemos buscar pílulas mágicas para camuflar nossa introspecção, nem aceitar convites para festas em que nada temos para brindar. Que nos deixem quietos, que quietude é armazenamento de força e sabedoria, daqui a pouco a gente volta, a gente sempre volta, anunciando o fim de mais dor – até que venha a próxima, normais que somos.

20 de novembro de 2005

(MEDEIROS, Martha. In: Doidas e Santas. Porto Alegre, RS: L&PM, 2010, p.21-23.)


quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Às nossas

Quero minhas lágrimas em teus olhos
Fazer do nosso choro um mar
Embaçar nossa imagem de tão perto
E tão profunda
E tão salgada...





terça-feira, 9 de agosto de 2011

Janta




Eu quis te conhecer, mas tenho que aceitar
caberá ao nosso amor o eterno ou o não dá
pode ser cruel a eternidade
eu ando em frente por sentir vontade


Eu quis te convencer, mas chega de insistir
caberá ao nosso amor o que há de vir
pode ser a eternidade má
caminho em frente pra sentir saudade


Paper clips and crayons in my bed
everybody thinks that I'm sad
I take my ride in melodies and bees and birds
will hear my words
will be both us and you and them together


I can forget about myself trying to be everybody else
I feel allright that we can go away
and please my day
I'll let you stay with me if you surrender

Eu quis te conhecer, mas tenho que aceitar
I can forget about myself trying to be everybody else
caberá ao nosso amor o eterno ou o não dá
I feel allright that we can go away
pode ser a eternidade má
and please my day
eu ando sempre pra sentir vontade
I'll let you stay with me if you surrender


(CAMELO, Marcelo) com Malu Magalhães



x








domingo, 7 de agosto de 2011

Puseram-me uma tampa


Puseram-me uma tampa —
Todo o céu.
Puseram-me uma tampa.
Que grandes aspirações!
Que magnas plenitudes!
E algumas verdadeiras…
Mas sobre todas elas
Puseram-me uma tampa.
Como a um daqueles penicos antigos —
Lá nos longes tradicionais da província —
Uma tampa.


(PESSOA, Fernando. In: Poesia Completa de Álvaro de Campos. São Paulo: Companhia da Letras, 2007. p.443)

domingo, 17 de julho de 2011

Blogagem coletiva: Minhas primeiras leituras

Quando Pretinho apareceu na minha vida, foi logo paixão a primeira vista. Eu mal havia aprendido a ler, de modo que as palavras iluminavam meu olhar, e a figura daquele boneco pretinho sentado na nuvem me fazia viajar. Eu ainda nem imaginava quantas e quantas vezes mais na vida eu estaria nas nuvens através da leitura. O bonito da história de Furtado era que, de forma tão singela, me falou de amizade e amor, mas também de preconceito, de história do Brasil, de maldade e de perdão.
A história do boneco que sofreu preconceito dos outros brinquedos por ser preto me fez sentir emoções das mais bonitas. Eu amava tanto aquele livro, que tinha vontade de contar sua história para todo o mundo. Os anos corriam, e todas as vezes que o lia, mais entendia o significado daquilo que muitas vezes eu veria na escola, na rua, e até mesmo em casa. O senso de solidariedade e de justiça me veio cedo... Por isso este livro me marcou tanto. Nem sei se foi o primeiro, mas sem dúvida foi o que me fez amar os livros e as boas histórias. E uma das semanas mais bonitas que passei na escola, já como professora, foi quando li o livro com minha turma de crianças. Mais uma vez chorei, por toda a emoção que a história me fez lembrar.

Gostaria de dizer aqui que minha infância foi rodeada de livros com suas histórias fantásticas, mas não foi. Em minha casa mal se via os livros que era preciso comprar para a escola e o jornal de domingo. Entretanto, foram esses mesmos que me deram as pistas necessárias para o mundo que eu seguiria pelo resto da minha vida. Costumo dizer que foram os livros que me escolheram, que me chamaram. E como professora que sou, acredito que o estímulo da família contribua significativamente para a inclusão das crianças no universo literário, mas qualquer criança pobre, sem incentivo na família, é capaz de reconhecer a beleza da literatura, se apaixonar, tornar-se escritor ou simplesmente amante da leitura.

Depois do “Pretinho, meu boneco querido”, muitos outros vieram encantando e desencantando meu mundo, porque literatura é assim, descortina até aquilo que não queremos ver, mas que precisamos enxergar.

Sobre sua serventia, deixo Bartolomeu Campos Queiróz dizer:

“A literatura (arte) não é servil. Ela só existe em liberdade, e seu compromisso é para com a revelação.”

E desde então a literatura me faz revelações que eu jamais poderia imaginar, sobre mim e sobre o mundo, desde a magia das aventuras de Narizinho, os encantos e realidades dos poemas de Drummond até as histórias viscerais de Dostievski. É tudo isso que vai constituindo o que sou, e o que ainda serei.


PS. Ao menino-homem, muito obrigada por me convidar mais uma vez para sua festa. Adoro! Parabéns!

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Lavando a alma

Recostada à parede de azulejo do box, deixava a água do chuveiro queimar seu corpo. O calor intenso das gotas que deslizavam sobre sua pele misturava-se às lágrimas. Absorta, seu olhar estava fixo para o ralo do box, onde escorria tudo que saía de sua pele e de seus olhos. Já nem mais sabia por que chorava, talvez fosse apenas o cansaço, cujo banho solitário tratava de cuidar.

Enquanto desanuviava o espírito, todo o banheiro se anuviava de branco vapor. Sua pele já ardia. Gostava daquela sensação de corpo se descolando do corpo. 

De repente, uma pequena lacraia vence o fluxo da água e surge do ralo. Ao invés de histeria ao vir o bicho peçonhento, nem se moveu. Continuou recostada à parede, certa de que a força da água se encarregaria de levar o bicho de volta ao seu lugar. 

Lembrou-se da menina chinesa, cujo único toque de carinho fora sentido através do pouso de uma mosca sobre seu corpo. Ao perceber a lacraia se aproximando fez um leve movimento com a perna, empurrando-a junto com a água para o ralo, que foi fechado com o dedo do seu pé. 


A água continuava a cair sobre seu corpo vermelho. Decidiu abrir mais o chuveiro, sentir a água mais fria... Pôs-se  de pé, corpo ereto. Antes que toda a água da piscina que se formara transbordasse por todo o banheiro, abriu o ralo e permitiu que tudo fosse abaixo de uma só vez. Centrou o rosto no jato do chuveiro, desligou-o depois de alguns segundos e envolveu-se na toalha macia. Deitou-se na cama e dormiu um sono leve e longo, como há muito não fazia.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Casa (Ana Jácomo)


Não faz muito tempo, uma amiga me disse que não tem estrutura para sentir dor com a intensidade com que geralmente sinto quando a dor resolve dar as caras. Ao escutar o barulho da porta que anuncia a chegada da dita-cuja, que sabe jeitos de abrir todo tipo de tranca, ela foge, contou-me rindo da costumeira estratégia. Irmanada também pelas artimanhas que inventamos pelo caminho, às vezes apenas para sobreviver às ameaças dos nossos próprios dramas, eu lhe perguntei como poderia escapar se a dor, ardilosa, espaçosa, já estava dentro de casa.

“Ah, querida, mas tem a porta dos fundos!...”

Tem mesmo.

Rindo ali com ela, cada uma experimentando a própria encrenca emocional da vez, com o roteiro da vez, com o cenário da vez, com o elenco da vez, eu me lembrei de um monte de situações em que tentei fugir da mesma maneira, pela porta dos fundos. Eu me lembrei de vezes em que, de fato, fugi, toda prosa por acreditar ter conseguido. Eu me lembrei que fugir, às vezes, é necessário para recuperar o fôlego. Para restaurar a força. Para retomar o contato.

Não é que eu tenha estrutura para sentir dor. A propósito, eu acredito que bravura mesmo é ter estrutura para sentir felicidade. Na verdade, toda vez que as dores abissais me visitam e mergulho no oceano nada pacífico do seu breu é trabalhoso demais emergir para o lugar onde eu já consiga ver pelo menos um bocadinho de sol. Na verdade, o que eu acho é que não tenho escolha que não seja invocar a coragem para ficar comigo e tentar transformar o que precisa ser transformado, mesmo doendo à beça, mesmo tremendo de medo. Aprendi com o tempo das fugas que quando a dor atravessa a porta é inútil correr. Na verdade, o que eu tenho, agora, simplesmente por memória, é alguma lucidez e um bocado de preguiça.

Toda porta dos fundos nos leva para um lugar fora da gente. Uma hora, mais cedo ou mais tarde, querendo ou não querendo, fazendo birra, tentando desconversar, precisamos voltar pra casa se não quisermos passar o resto da vida longe de nós mesmos. E aí tanto faz por qual porta nós voltamos, se pela da frente, se pela dos fundos: a dor está lá, empoeirada que seja. Cheirando a mofo, quem sabe. Esta lá, com uma cara ou com outras, paciente, a nossa espera. E maior, bem maior, que fuga costuma ser fermento. Ela não vai embora só porque a gente fugiu. Quem dera pudesse.

Aprendi com o tempo das fugas e com o resultado de cada uma delas que podemos adiar o encontro do nosso olhar com os olhos perturbadores da dor, mas não tem jeito: em algum quarteirão da vida, eles vão se encontrar. Por isso, agora, toda vez que acontece, escolho ficar em casa. Escolho encarar de uma vez. Mergulho inteirinha, protegida com o escafandro da fé e do amor que me habitam.

Dor adiada é dor acumulada, apenas isso, é o que aprendi comigo. É o que aprendi com as dores. E a vida é tão mágica que, lá no fundo mais fundo do oceano nada pacífico de cada uma delas, lá no instante ou quase em que a pilha da lanterna acaba, a gente descobre um jeito novo, muito lindo, muito nosso, comovente muitas vezes, para conseguir emergir e transformar o que parecia impossível de transformação. E não é exagero dizer que geralmente emergimos mais corajosos. Mais ternos. Mais bondosos. Mais nós mesmos. Mais conscientes do que, de verdade, nos importa. Com mais urgência de nos sentirmos felizes na nossa própria pele.

No fundo mais fundo, não é raro nos sentirmos sozinhos. Estamos doendo tanto que, pra começo de conversa, a nossa própria presença nos falta, isto que é a mais perigosa solidão. Mas é um engano temporário, comum nos tempos em que os nossos olhos estão embaçados demais pelo medo: tanto faz o aparente e transitório tamanho da solidão, não estamos sozinhos nunca. E não estamos mesmo.

O amor, não importa de que forma se manifeste, encontrará maneiras para nos tirar lá desse lugar com recursos às vezes inimagináveis. Podemos estar tão cansados pelo breu que não conseguimos perceber num primeiro momento, nem num oitavo, nem num trigésimo, o convite da luz. Mas, de um jeito ou de outro, o amor que nos habita não cansará de tentar. Ele não foge pela porta dos fundos.

JÁCOMO, Ana. In: Cheiro de flor quando ri

terça-feira, 28 de junho de 2011

Querido diário*

Hoje, ao ouvir-te cantando teu “Querido Diário”, deu-me uma vontade grande de vir aqui e escrever no meu diário, querido também. O tempo afastada foi apenas por não saber muito o que dizer, talvez por que está sendo um tanto difícil dizer coisas bonitas, que é o que eu gostaria de poder fazer sempre.

Ah, Chico!... Meus amigos também me dão “bom dia” cheios de carinho, mas acho que eles não têm pena de mim não, nem deles; eles não sabem que sou sozinha, que todos somos. E nos últimos dias minha cidade também tem andado na contramão, e eu, sem saber o que fazer, também tenho pensado em ter uma religião, porque quando o bicho pega a gente pensa logo em se fiar com Deus e todos os santos vez por todas. Será que religião resolve, Chico?

Fé. Acho que a fé pode ajudar... E amor também. Isso me sobra.

Mas Chico, eu quero mesmo é ser macio que nem você, e não quebrar, por mais forte que seja a pancada do porrete.



*Música do novo CD de Chico Buarque, que será lançado em julho. Para ouví-la clique aqui.

 "Hoje topei com alguns
conhecidos meus

Me dão bom-dia [bom-dia], cheios de carinho;

dizem para eu ter muita luz
e ficar com Deus
Eles têm pena de eu viver sozinho


Hoje a cidade acordou
toda em contramão

Homens com raiva,

buzinas, sirenes, estardalhaço


De volta à casa, na rua
recolhi um cão
que, de hora em hora, me arranca um pedaço

 
Hoje pensei em ter religião
De alguma ovelha, talvez,
fazer sacrifício
Por uma estátua ter adoração

Amar uma mulher sem orifício



Hoje, afinal, conheci o amor
E era o amor, uma obscura trama
não bato nela, não bato

nem com uma flor

mas se ela chora, desejo-me em flama


Hoje o inimigo veio,

veio me espreitar

Armou tocaia lá

na curva do rio
Trouxe um porrete, um porrete a "mode" me quebrar
mas eu não quebro não, porque sou macio, viu?!"


ps. "vai passar" esse zumzumzum por cousa da mulher sem orifício. Af! rs.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

Até qualquer dia

Estou indo, mas vou deixar a chave naquele esconderijo que combinamos, tá bom? Você pode entrar quando quiser, e pode ficar bastante a vontade. A casa é tua. Na verdade, a casa só existe por tua causa. E sendo tua,  podes fazer o uso que bem entender: festas, abrigo, orgias ou oração. Só não te esqueças de bater a porta quando sair, e deixe a chave sempre no mesmo lugar, para o caso de um dia eu querer voltar. Sim, a gente sempre pode voltar, sobretudo quando a gente foi feliz em um lugar. E eu fui muito feliz aqui. Parto com as mais doces lembranças e deixo todo o meu afeto.

Carinho,

Isa.


sexta-feira, 8 de abril de 2011

Triste...

Eu sei que, não sendo mãe, jamais entenderei plenamente tuas lágrimas na perda de teu filho.
Eu sei que, mesmo sendo professora, não era eu quem estava naquela escola, naquela sala, com aquelas crianças.
Eu sei que, embora eu já tenha tido a tua idade, jamais conhecerei a dor de perder amigos na adolescência.
Eu sei que tudo que eu vi, não foi nada diante do horror pelo qual tu passaste.
Eu sei que as minhas lágrimas estão longe de arder como as tuas.
Eu sei que tua dor é só tua e, portanto, ninguém mais neste mundo pode senti-la da mesma forma.
Mas saiba que eu também chorei, e ainda choro.
Chorei porque tudo pode acontecer, aí ou aqui.
Porque estamos todos desprotegidos da maldade humana.
Porque somos humanos.
Chorei porque querem nos vender essa tragédia como um crime americano, mas este crime é brasileiríssimo; todos os dias alunos e funcionários são agredidos.
Chorei porque não aguento mais tantas teorias que não dão conta de nada.
E não aguento mais a mídia fazendo, da tragédia, espetáculo.
Chorei porque sei que, quando o espetáculo acabar, tudo será esquecido, como se esquece tudo neste país.
Chorei porque é a única coisa que posso fazer agora.


quarta-feira, 6 de abril de 2011

Cuida de mim (O Teatro Mágico)

Pra falar verdade, às vezes minto 
Tentando ser metade do inteiro que eu sinto
Pra dizer às vezes que às vezes não digo
Sou capaz de fazer da minha briga meu abrigo
"Tanto faz" não satisfaz o que preciso
Além do mais quem busca nunca é indeciso


Eu busquei quem sou
Você pra mim mostrou
Que eu não sou sozinha nesse mundo.

Cuida de mim enquanto não me esqueço de você
Cuida de mim enquanto finjo que sou quem eu queria ser.
Cuida de mim enquanto não me esqueço de você
Cuida de mim enquanto finjo... Enquanto fujo...





Basta as penas que eu mesmo sinto de mim
Junto todas, crio asas, viro querubim
Sou da cor do tom, sabor e som que quiser ouvir
Sou calor, clarão e escuridão que te faz dormir
Quero mais, quero a paz que me prometeu
Volto atrás se voltar atrás assim como eu.

Busquei quem sou
Você pra mim mostrou
Que eu não estou sozinho nesse mundo.

Cuida de mim enquanto não me esqueço de você
Cuida de mim enquanto finjo que sou quem eu queria ser.
Cuida de mim enquanto não me esqueço de você
Cuida de mim enquanto finjo... Enquanto fujo...




composição : Fernando Anitelli

domingo, 3 de abril de 2011

Domingo, este.

Nenhum desejo neste domingo
nenhum problema nesta vida
o mundo parou de repente
os homens ficaram calados
domingo sem fim nem começo


A mão que escreve este poema
não sabe que está escrevendo
mas é possível que se soubesse
nem ligasse.


DRUMMOND, Carlos. In: Alguma poesia.