quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Lula, o câncer, o SUS e o Sírio (Elio Gaspari)

As pessoas que estão reclamando porque Lula não foi tratar seu câncer no SUS dividem-se em dois grupos: um foi atrás da piada fácil, e ruim; o outro, movido a ódio, quer que ele se ferre. Na rede pública de saúde, em 1971, Lula perdeu a primeira mulher e um filho. Em 1998, o metalúrgico tornou-se candidato à Presidência da República e pegou pesado: "Eu não sei se o Fernando Henrique ou algum governador confiaria na saúde pública para se tratar". Nessa época acusava o governo de desossar o SUS, estimulando a migração para os planos privados. Quando Lula chegou ao Planalto, havia 31,2 milhões de brasileiros no mercado de planos particulares. Ao deixá-lo, essa clientela era de 45,6 milhões, e ele não tocava mais no assunto.

Em 2010, Lula inaugurou uma Unidade de Pronto Atendimento do SUS no Recife dizendo que "ela está tão bem localizada, tão bem estruturada, que dá até vontade de ficar doente para ser atendido". Horas depois, teve uma crise de hipertensão e internou-se num hospital privado.

Lula percorreu todo o arco da malversação do debate da saúde pública. Foi de vítima a denunciante, passou da denúncia à marquetagem oficialista e acabou aninhado no Sírio-Libanês, um dos melhores e mais caros hospitais do país. Melhor para ele. (No andar do SUS, uma pessoa que teve dor de ouvido e sentiu algo esquisito na garganta leva uns 30 dias para ser examinada corretamente, outros 76, na média, para começar um tratamento quimioterápico, 113 dias se precisar de radioterapia. No andar de Lula, é possível chegar-se ao diagnóstico numa sexta e à químio, na segunda. A conta fica em algo como R$ 50 mil.)

Lula, Dilma Rousseff e José Alencar trataram seus tumores no Sírio. Lá, Dilma recebeu uma droga que não era oferecida à patuleia do SUS. Deve-se a ela a inclusão do rituximab na lista de medicamentos da saúde pública.

Os companheiros descobriram as virtudes da medicina privada, mas, em nove anos de poder, pouco fizeram pelos pacientes da rede pública. Melhoraram o acesso aos diagnósticos, mas os tratamentos continuam arruinados. Fora isso, alteraram o nome do Instituto Nacional do Câncer, acrescentando-lhe uma homenagem a José Alencar, que lá nunca pôs os pés. Depois de oito anos: 1 em cada 5 pacientes de câncer dos planos de saúde era mandado para a rede pública. Já o tucanato, tendo criado em São Paulo um centro de excelência, o Instituto do Câncer Octavio Frias de Oliveira, por pouco não entregou 25% dos seus leitos à privataria. (A iniciativa, do governador Geraldo Alckmin, foi derrubada pelo Judiciário paulista.)

A luta de José Alencar contra "o insidioso mal" serviu para retirar o estigma da doença. Se o câncer de Lula servir para responsabilizar burocratas que compram mamógrafos e não os desencaixotam (as comissões vêm por fora) e médicos que não comparecem ao local de trabalho, as filas do SUS poderão diminuir. Poderá servir também para acabar com a política de duplas portas, pelas quais os clientes de planos privados têm atendimento expedito nos hospitais públicos.

Lula soube cuidar de si. Delirou ao tratar da saúde dos outros quando, em 2006, disse que "o Brasil não está longe de atingir a perfeição no tratamento de saúde". Está precisamente a 33 quilômetros, a distância entre seu apartamento de São Bernardo e o Sírio.


(Artigo Publicado por Elio Gaspari na Folha de São Paulo de 02/11/11)


Minha mãe, assim como outros tantos brasileiros, está em tratamento contra o câncer pelo SUS. Após o diagnóstico, que demorou mais de um mês (na rede privada), tivemos que esperar mais de 2 meses para o início efetivo do tratamento (quimioterapia) em hospital conveniado ao SUS. Quase quatro meses de espera estão fazendo toda a diferença no tratamento, pois foi o tempo necessário para o tumor dobrar de tamanho.

"Só há que sublinhar, há que ressaltar, há que insistir aos brasileiros, meus irmãos: corações, fígados, sangue e rins – são todos muito iguais. Não há diferenças relevantes. O cargo ocupado não pode, não poderia, não deveria fazer a diferença entre a vida e a morte." (Fernando Vieira)


9 comentários:

  1. Ficam minha torcida pela sua mãe e agradecimentos pelo trecho que vc gentilmente trouxe pra cá.

    Obrigado e força sempre!

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  2. Ótimo texto! A mais pura verdade. Adoro isso, imparcial, cru.

    O câncer de Lula servirá apenas para ele mesmo, pois toda doença chega com endereço certo. Há quem aprenda, há quem não consegue.

    Lamento por tua mãe. Há pouquíssimo tempo, tive esse problema dentro de casa. Não é fácil. Meu parente tem plano de saúde particular, mas quando descobriu o problema era muito tarde. Só não foi tarde para Deus, por causa dEle 'aquilo tudo' encontrado se desfez.

    As doenças aparecem para que possamos rever fatos, sentimentos, a própria vida, num todo. Elas sempre existirão, apesar da capacidade do homem em derrubar muitas delas (a história prova isso).

    É a vida mostrando o tempo todo nossa falibilidade.

    Que tua mãe fique bem, consiga a vitória!

    Um abraço,

    Suzana/LILY

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  3. Obrigada, Fernando.

    Obrigada, Su.

    Bjs!

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  4. infelizmente o discurso não se transformou em realidade...

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  5. Belinha, muita força para vocês passarem logo por esses momentinhos tão difíceis. Tenho certeza que pessoas tão queridas como vocês estão recebendo todas as boas vibrações e carinho dos amigos. Mando aqui um abraço forte! Um beijão, lu

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  6. IsaBele,
    Fiz uma oração pela saúde de sua mãe.
    Obrigada pela visita ao meu 'Ruas e papéis' e pela indicação ao seu escrito de dança...'Dançando'.
    Olha, seu blog é muito bom mesmo. Que achado!
    Abraço, menina!

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  7. acho mesmo uma falta de consideração com as pessoas que tem cancer,com meu pai não foi diferente.
    pois o sus atrasou nos exames e no tratamento,depois que ele descobriu a doença demorou 4 meses para o tratamento.
    1 ano depois estavamos sepultando meu pai,acho que a partir de quando estão suspeito do cancer deveriam internar e fazer todos os exames e imediatamente a quimioterapia.só não se dedicam mais para a saúde do povo,por que nossos politicos não precisam do sus.

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  8. acho mesmo uma falta de consideração com as pessoas que tem cancer,com meu pai não foi diferente.
    pois o sus atrasou nos exames e no tratamento,depois que ele descobriu a doença demorou 4 meses para o tratamento.
    1 ano depois estavamos sepultando meu pai,acho que a partir de quando estão suspeito do cancer deveriam internar e fazer todos os exames e imediatamente a quimioterapia.só não se dedicam mais para a saúde do povo,por que nossos politicos não precisam do sus.

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