quinta-feira, 31 de março de 2011

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Metrô lotado. Calor e chuva. Aula tensa. Discursos tristes. Violência contra mulheres. Violência contra homossexuais. Violência contra negros. Gênero. Sexualidades. Diversidade. Histórias. Alguma esperança. Podemos esperar? Às vezes não entendo nada, mas tudo parece claro. Às vezes entendo tudo, mas nada tem solução. Um rapaz se joga do décimo andar. Notícia de tiroteio no caminho. Alguém não chega. Ando tensa na hora do almoço. Relaxo na volta pra casa. Carteira e celular roubados. Delegacia. Números. Palavras vazias.  Mulher violentada. Vizinha tem morte súbita. 190 não atende. Alguns desaparecidos. Todos invisíveis. Crianças ainda com uniforme. Nada entendem. Tudo entendem. Do viaduto vejo o prédio, bonito. Do lado de fora parece que jogaram uma bomba atômica. Vazio.  Não há ninguém em casa. Alguém liga. Uma vez. Duas vezes. Três vezes. Que bom que alguém liga. Alguma esperança?

domingo, 27 de março de 2011

Se fiquei esperando meu amor passar

Se fiquei esperando meu amor passar
Já me basta que então, eu não sabia amar

e me via perdido e vivendo em erro
Sem querer me machucar de novo
Por culpa do amor
Mas você e eu podemos namorar.
E era simples: ficamos fortes.
Quando se aprende a amar
O mundo passa a ser seu
Quando se aprende a amar
O mundo passa a ser seu
Sei rimar romã com travesseiro
Quero a minha nação soberana
Com espaço, nobreza e descanso.






















Se fiquei esperando meu amor passar
Já me basta que estava então longe de sereno
E fiquei tanto tempo duvidando de mim
Por fazer amor fazer sentido.
Começo a ficar livre
Espero. Acho que sim.
De olhos fechados não me vejo e,
Você sorriu pra mim.


"Cordeiro de Deus que tirai os pecados do mundo,
Tende piedade de nós.
Cordeiro de Deus que tirai os pecados do mundo,
Tende piedade de nós.
Cordeiro de Deus que tirai os pecados do mundo,
Dai-nos a paz."





Composição : Dado Villa-Lobos/Renato Russo/Marcelo Bonfá




Feliz aniversário, Renato!


"É tão estranho
Os bons morrem jovens
Assim parece ser
Quando me lembro de você
Que acabou indo embora
Cedo demais..."

terça-feira, 22 de março de 2011

Poesia desatada

Procurei
mas não há mais espaço
entre pensamento e fala
entre sentimento e escrita
É como um nó na garganta
que sufoca
e não permite o esvaziamento
do que há cá dentro

Está tudo atravessado
nos versos não paridos
no poema não revelado

Tudo é fantasia
é não dito
é sentido
Não faz sentido!

Escrevo
Apago
Escrevo
Apago
Não desato

O que me resta
é buscar nos versos de outros
meu sentimento roubado
recitado em estranhas bocas
que dizem o que quero me dizer-te
mas não sei

Já que os versos não despertam
o que me resta
é contentar-me com este mundo verdade
este mundo meu e nosso
Versos tortos
a me dizer

Versos tortos
Jeito torto
Vida torta

E esse nó na garganta
que não passa
O que quer me dizer?
Será que são mesmo estes teus versos
Retos?
Ou será que estes são apenas
meu desejo de se querer ser?

Na verdade
não me importo
Qualquer verso, havendo poesia
Qualquer poema, havendo poesia
Qualquer coisa, havendo poesia
Nesta noite chuvosa
me traz contentamento

Pois, em noites de chuva
só,
só a poesia salva.


Montenegro, O. Poema quebrado. 


Língua
"Gosto de sentir a minha língua roçar a língua de Luís de Camões 
Gosto de ser e de estar 
E quero me dedicar a criar confusões de prosódias 
E uma profusão de paródias que encurtem dores 
E furtem cores como camaleões 
Gosto do Pessoa na pessoa da rosa no Rosa 
E sei que a poesia está para a prosa 
assim como o amor está para a amizade
E quem há de negar que esta lhe é superior?" 
Veloso, C. 

Poesia
"Gastei uma hora pensando um verso
Que a pena não quer escrever.
No entanto, ele está cá dentro
Inquieto, vivo.
Ele está cá dentro e não quer sair.
Mas a poesia deste momento
Inunda minha alma inteira."
Drummond, C.

domingo, 20 de março de 2011

Verbete

Poesia é amparo
é aditivo para aguçar o faro
é raro paladar


Poesia é o lado de fora da caverna de Platão
e é também o lado de dentro da escuridão
Avesso da lucidez
Nacos de sensatez
Para a loucura é veneno e cura


Poesia é palavra cruzada no meio da estrada
é solução e também encruzilhada


Poesia é máscara e também espelho
é sol pintado de azul e céu de vermelho


Poesia e coisa de menino e menina
de mocinho e bandida
de gente simples ou bem sucedida


Poesia é descompassado coração
é calmaria e perturbação
é pieguice
é sofisticação


Poesia é café com licor
é destilar razão e amor


Poesia é tara
é tapa na cara
é lâmina na carne


Poesia é agulha alívio morfina


Poesia é vício de tatuar papiro


Sem ela eu piro.




QUEIROZ, Helen. In: Vício de Tatuar Papiro.

quarta-feira, 16 de março de 2011

...

Olhei a vida pela fresta da janela e continuei
querer estar comigo mesma. 
Sem culpa, sem medo, sem solidão: 
na melhor companhia de mim.


"De vez em quando é necessário a gente
se perguntar se dentro de nós é um bom
lugar pra se viver. Tenho me perguntado isso... 
e a resposta é sim, Sou um bom lugar."
Martha Medeiros

segunda-feira, 14 de março de 2011

Apesar de tudo

Apesar de tudo que meus olhos veem
ainda tenho esperança
no Haiti
no Brasil 
no Japão
em você
em mim.

quarta-feira, 9 de março de 2011

Então, feliz ano novo!



“Para você, desejo o sonho realizado. O amor esperado. A esperança renovada. Para você, desejo todas as cores desta vida. Todas as alegrias que puder sorrir. Todas as músicas que puder emocionar. Para você neste novo ano, desejo que os amigos sejam mais cúmplices, que sua família esteja mais unida, que sua vida seja mais bem vivida. Gostaria de lhe desejar tantas coisas. Mas nada seria suficiente... Então, desejo apenas que você tenha muitos desejos. Desejos grandes e que eles possam te mover a cada minuto, ao rumo da sua felicidade”

Carlos Drummond de Andrade

domingo, 6 de março de 2011

Desejo

Do desejo tenho apenas ele: insaciável, impossível, eterno. Porque desejo que se preze não se satisfaz. Desejo não é vontade que se mata, nem aquela que dá e passa. Desejo que é desejo permanece, deseja o próprio desejo desejando o que não há, o que não existe, para poder sempre desejar. O chocolate para aliviar a tensão, o prato cheio a saciar a fome, o sorvete de jaca da grávida, são apenas necessidades que, logo satisfeitas, já contentam o beneficiado. Já o desejo permanece, quer sempre algo mais. No meu corpo, não se contenta com as noites sobre o dele, pois quer mesmo é se fundir, tornar um. Na minha língua, não se contenta com o doce ou amargo, ele quer todos os sabores de uma só vez, todo o desconhecido dos gostos impossíveis. Nos meus pés, não se contenta com os caminhos por onde andei, ele quer as estradas vastas infinitas sob os pés descalços. Nos meus rabiscos, não quer um livro com início, meio e fim, mas a sabedoria de Xerazade em Mil e Uma Noites. Nos meus ouvidos, não se contenta com os sons desta chuva, ou desta música de hoje ou de ontem, ele quer o som de todos os mares e de toda a natureza e de todos os ritmos, que de tão ricos não se sabe onde acabam. Desejo é vontade infinita. Como disse Adélia Prado, “não quero faca nem queijo, quero a fome”. Desejo é fome. Fome que não passa. E às vezes dói no estômago.

"Só o desejo inquieto, que não passa,

Faz o encanto da coisa desejada..."

Quintana.

terça-feira, 1 de março de 2011

Me acorde, viu?

Olha, se por acaso você pensar que não estou, bata mais um pouco na porta. Às vezes fico cansada e meio surda. Às vezes é difícil levantar da cama pra atender qualquer pessoa, qualquer coisa que eu não saiba o quê. Mas se for você, insista mais um pouco. Porque eu vou levantar reclamando, com meu mau humor matinal, mas quando eu abrir a porta sentirei a maior alegria do mundo, só porque é você. Vai ser daquelas alegrias inesperadas, que levantam qualquer defunto do caixão, como diria minha avó. Num piscar de olhos eu vou achar o dia lindo, mesmo que esteja chovendo, porque você enfeita qualquer dia.  Tomaremos um café meio amargo, sentados no chão. (Eu me desfiz de mesas, cadeiras e outras tralhas. Preciso de chão.)  E você vai adoçando com suas palavras, a mim e ao café.  Passaremos o dia inteiro falando das bobagens sérias da vida, inventando frases bonitas, rindo das bizarrices da última festa e aproveitando o mundinho que criamos pra nós aqui nesta sala. Nem saberemos mais do dia lá fora. Limitaremo-nos à infinitude do nosso dia aqui dentro, que vai acabar quando você for embora. Mas acordar para mais um dia terá valido a pena.