domingo, 30 de janeiro de 2011

Um coração fraco

O que fazer quando a felicidade transborda? Como agir quando não se sabe merecedor de tantas benécies? Como agradecê-las? Porque a felicidade nos escolhe, dentre tantos?

Estas e outras questões me foram trazidas por Dostoievski na sensível peça “Um coração fraco”, brilhantemente interpretada por Caio Blat e Kadu Fávero. A história fala de amor, amizade, felicidade e loucura. Vássia, um rapaz pobre que trabalha em uma repartição pública, interpretado por Caio, se vê diante de um grande amor correspondido, sucesso profissional, além de poder contar com a sincera amizade de seu companheiro Arkaddi. Sua vida se torna tão feliz, tudo parece dar tão certo, que seu coração não suporta a própria felicidade. O moço não se acha merecedor de tanto e entra num processo de enlouquecimento que arranca lágrimas tanto da platéia quanto do próprio elenco.

Afinal, num mundo onde as pessoas almejam a felicidade gratuita, o que seria necessário para merecê-la? Durante o espetáculo eu pensava se realmente eu merecia aquela mão segurando a minha, companheira de tantos anos. Se realmente eu fiz algo merecedor de tão lindos amigos que a vida me trouxe; de uma família torta, mas tão igualmente bonita, e de um trabalho que me dignifica. Será que a vida é realmente um espelho a lhe devolver o que nela você projeta? Existe a sorte? Existem os eleitos à felicidade? Existe um jeito de agradecer?

Eu já me considero lindamente mimada por Deus, sobretudo por conseguir encontrar o equilíbrio de me manter sã diante do muito ou pouco que me cabe. Não sei se mereço tudo que tenho, ou se mereço mais. Talvez a raposa esteja certa: "tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas". Talvez eu também tenha cativado alguns.

Conheço algumas pessoas de coração de fraco, tanto para a tristeza quanto para as alegrias. Meu coração é fraco para as tristezas e tento fortalecê-lo, mas é forte para a felicidade. E além de forte, é pidão e quer sempre mais. Ele estará sempre aberto às alegrias e, transbordando ou não, quero sempre  dividi-las com todas essas pessoas especiais que fazem parte da minha vida. Talvez seja este meu agradecimento, sem obrigação alguma, mas por pura vontade de compartilhar beleza, e quando for necessário, também a tristeza.

Um forte abraço e bela semana a todos!

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Caso de Amor

Uma estrada é deserta por dois motivos: por abandono ou por desprezo. Esta que eu ando nela agora é por abandono. Chega que os espinheiros a estão abafando pelas margens. Esta estrada melhora muito de eu ir sozinho nela. Eu ando por aqui desde pequeno. E sinto que ela bota sentido em mim. Eu acho que ela manja que eu fui para a escola e estou voltando agora para revê-la. Ela não tem indiferença pelo meu passado. Eu sinto mesmo que ela me reconhece agora, tantos anos depois. Eu sinto que ela melhora de eu ir sozinho sobre seu corpo. De minha parte eu achei ela bem acabadinha. Sobre suas pedras agora raramente um cavalo passeia. E quando vem um, ela o segura com carinho. Eu sinto mesmo hoje que a estrada é carente de pessoas e de bichos. Emas passavam sempre por ela esvoaçantes. Bando de caititus a atravessavam para ir ao rio do outro lado. Eu estou imaginando que a estrada pensa que eu também sou como ela: uma coisa bem esquecida. Pode ser. Nem cachorro passa mais por nós. Mas eu ensino para ela como se deve comportar na solidão. Eu falo: deixe, deixe meu amor, tudo vai acabar. Numa boa: a gente vai desaparecendo igual quando Carlitos vai desaparecendo no fim de uma estrada… Deixe, deixe, meu amor.

BARROS, Manoel de. In: Memórias Inventadas: a infância. São Paulo: Planeta, 2003.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Os cães também sofrem...

Não diria que o melhor amigo do homem é o cão, mas sem dúvidas os cães são grandes amigos dos homens, íntegros e fieis aos seus donos como poucos de nós, humanos. Portanto não podemos esquecer-nos desses e outros animais que também são vítimas sobreviventes da tragédia do Rio, e estão sofrendo a perda de seus companheiros e abrigos. Meu cachorrinho entra em depressão quando eu passo alguns dias longe e o deixo sob os cuidados de minha mãe, que o adora e ambos se conhecem muito bem. Não posso imaginar a solidão que esses animais também possam estar sofrendo diante do caos.

Fiquei emocionada com a história do cão que passou dias ao lado do túmulo de sua dona, em Teresópolis. Lembrei-me do filme “Para sempre ao seu lado”, que conta a história real de um cão que passou 14 anos esperando seu dono, que estava morto, voltar, até a sua própria morte. Fidelidade difícil de encontrar...




Bjs!

domingo, 16 de janeiro de 2011

Rio de lágrimas e solidariedade

Queridos, sabemos que as perdas são incalculáveis, principamente aquelas que não são materiais. Mas acredito que seja possível aliviarmos um pouquinho a dor dessas pessoas que passam por esta tragédia que assola a região serrana do Rio, que um dia fora palco de belas noites de inverno e hoje sofre de um frio difícil de aquecer.

Vamos ajudar com ações, seja você do Rio de Janeiro ou não, as famílias que sobreviveram à tragédia. Lembremos que além das doações de materiais, os postos de recolhimento estão precisando de voluntários para fazerem a triagem dos materiais arrecadados.

Que Deus nos abençoe.




COMO AJUDAR

  • Uma conta corrente também recebe doações para ajudar as famílias atingidas pelo temporal. Nome da conta: "SOS Teresópolis - donativos".
Agência: 0741 (Banco do Brasil) – Conta: 110000-9.



  • Cruz Vermelha - Praça da Cruz Vermelha, 10 – Centro do Rio.
Estão sendo arrecadados: água mineral, alimentos de pronto consumo (massas e sopas desidratadas, biscoitos, cereais), leite em pó, colchões, roupa de cama e banho e cobertores.

  • Prefeitura de Petrópolis – Igreja Wesleyana; Igreja de Santa Luzia; Sede da Secretaria de Trabalho, Ação Social e Cidadania.
Os três postos arrecadam doações de água, colchões e materiais de limpeza e higiene pessoal.
  • Prefeitura de Teresópolis – Ginásio Pedrão – Rua Tenente Luiz Meirelles, 211 – Várzea.
Estão sendo arrecadados: alimentos, roupas, cobertores, colchonetes e itens de higiene pessoal.

  • Rodovia BR-040 - Concer - Praças de pedágio da BR-040 situadas em Duque de Caxias (km 104), Areal (km 45) e Simão Pereira (km 816), além da sede da empresa (km 110/JF, em Caxias).
A Concer pede que sejam doados, preferencialmente, água mineral, produtos de higiene pessoal e de limpeza, roupas de cama, mesa e banho, além de colchonetes. Nas praças de pedágio, as doações podem ser entregues nos postos do serviço de informação ao usuário da rodovia, que funcionam de segunda a segunda, 24 horas por dia.
  • Hemorio – Rua Frei Caneca, 8 – Centro do Rio – Das 7h às 18h.
O Hemorio pede que as pessoas doem sangue para as vítimas das chuvas. Os estoques estão quase zerados. Friburgo e Teresópolis solicitaram 300 bolsas, mas o Hemorio não tem como atender. Pode doar sangue quem tiver entre 18 e 65 anos, mais de 50 quilos e estiver bem de saúde. Basta levar um documento oficial de identidade com foto.
Informações e agendamento pelo disque sangue 0800-282-0708.

  • Supermercados – Grupo Pão de Açúcar
Postos de coleta foram montados pela empresa em todas as suas 100 lojas das redes Pão de Açúcar, ABC Comprebem, Sendas, Extra e Assaí, em todo o estado Rio de Janeiro para que os clientes possam cooperar com doações de alimentos não perecíveis, roupas e cobertores. A ação acontece até o dia 26 de janeiro.

  • Polícia Rodoviária Federal - Ver postos abaixo.
Maior necessidade é por água, leite em pó, materiais de higiene e limpeza e colchões.

Postos da PRF que receberão doações:

BR-116: KM 133 (Doações 24 horas)
BR-101: KM 269 (Doações 24 horas)
BR-040: KM 109 (Doações das 8h às 17h)
BR-116: KM 227 (Doações das 8h às 17h)

  • Rodoviária Novo Rio - Avenida Francisco Bicalho, 1 - Santo Cristo.
A Rodoviária Novo Rio recebe doações para a Cruz Vermelha. Os donativos são recebidos no embarque inferior, das 9 às 17 horas.

  • Polícia Militar - Todos os batalhões da Polícia Militar do estado serão centros de recepção de doações.
Comandantes dos batalhões recomendam que sejam doados água mineral, alimentos não perecíveis e material de higiene pessoal.
  • Viva Rio - O Programa de Voluntariado do Viva Rio também iniciou uma campanha de arrecadação de roupas e mantimentos para a região serrana do Rio de Janeiro, especialmente Nova Friburgo, Teresópolis e Petrópolis.
Para ajudar, basta fazer a doação na sede do Viva Rio (Rua do Russel, 76, Glória). Para mais informações o Viva Rio disponibiliza os telefones (21) 2555-3750 e (21) 2555-3785.
  • Metrô do Rio de Janeiro
O Metrô Rio, em parceria com a ONG Viva Rio, recolhe doações para os desabrigados. A coleta será feita em 11 estações das Linhas 1 e 2 (Carioca, Central, Largo do Machado, Catete, Glória, Ipanema/General Osório, Pavuna, Saens Peña, Botafogo, Nova América / Del Castilho, Siqueira Campos).

 
"Eu não acredito em caridade. Eu acredito em solidariedade. Caridade é tão vertical: vai de cima para baixo. Solidariedade é horizontal: respeita a outra pessoa e aprende com o outro. A maioria de nós tem muito o que aprender com as outras pessoas." (Eduardo Galeano)

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Ao sabor das leituras

Há algum tempo a Dri Ogêda, colega queridíssima do blog MEVITEVENDO, vem me convidando para participar do Desafio Literário. Trata-se de um incentivo muito bacana para atualizar leituras e variá-las, de modo a conhecer diversos gêneros e títulos, e ainda conhecer as impressões sobre outras leituras dos colegas participantes. Dentre as regras está ler pelo menos um livro por mês, que deverá ser escolhido de acordo com o tema que o desafio propõe, e ao final de cada leitura escrever uma resenha ou comentários sobre a obra lida e publicar no seu blog.
Pensei em participar do desafio este ano, mas diante de várias leituras me esperando nas minhas prateleiras (e a maioria não está de acordo com os temas propostos para este ano), e também por eu estar mega enrolada terminando uma especialização, iniciando outra, e ainda finalizando um outro trabalho que está sendo difícil, preferi deixar para o ano que vem, não por causa das leituras, mas devido o compromisso de fazer a resenha, e escrever não tem sido nada fácil. Então, pra não ficar totalmente em dívida com o convite da Dri, este ano vou tentar escrever sobre alguns livros que eu ler e achar interessante, porém sem nenhuma regra ou prazos a cumprir. Mas acho o desafio muito interessante, e quem quiser conhecer e participar clique aqui e boas leituras!
Vou começar então deixando pra vocês um trecho de um livro que eu estou começando a ler, e que resolvi comprá-lo após a leitura deste pequeno capítulo que descreve o beijo de uma forma tão bonita, que ainda não li outra melhor. O livro é “O jogo da amarelinha”, um romance de Cortázar.
“Toco a tua boca, com um dedo toco o contorno da tua boca, vou desenhando essa boca como se estivesse saindo da minha mão, como se pela primeira vez a tua boca se entreabrisse, e basta-me fechar os olhos para desfazer tudo e recomeçar. Faço nascer, de cada vez, a boca que desejo, a boca que a minha mão escolheu e te desenha no rosto, uma boca eleita entre todas, com soberana liberdade eleita por mim para desenhá-la com minha mão em teu rosto e que por um acaso, que não procuro compreender, coincide exatamente com a tua boca que sorri debaixo daquela que a minha mão te desenha.
Tu me olhas, de perto tu me olhas, cada vez mais de perto e, então, brincamos de cíclope, olhamo-nos cada vez mais de perto e nossos olhos se tornam maiores, aproximam-se, sobrepõem-se e os cíclopes se olham, respirando indistintas, as bocas encontram-se e lutam debilmente, mordendo-se com os lábios, apoiando ligeiramente a língua nos dentes, brincando nas suas cavernas, onde um ar pesado vai e vem com um perfume antigo e um grande silêncio. Então, as minhas mãos procuram afogar-se nos teus cabelos, acariciar lentamente a profundidade do teu cabelo enquanto nos beijamos como se tivéssemos a boca cheia de flores ou de peixes, de movimentos vivos, de fragrância obscura. E, se nos mordemos, a dor é doce; e, se nos afogamos num breve e terrível absorver simultâneo de fôlego, essa instantânea morte é bela. E já existe uma só saliva e um só sabor de fruta madura, e eu sinto você tremular contra mim, como uma lua na água.”

(CORTÁZAR, Júlio. In: O jogo da amarelinha. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2009, p.45)

Um beijo e uma linda semana a todos!
Um beijo especial ao Rômulo.